sábado, 3 de dezembro de 2011

7 anos

Dormia tranquilamente quando uma mão pequena e macia tocou delicadamente o meu rosto e despertou-me. Abri os olhos e me deparei com lindos olhos castanhos arregalados, que transmitiam um certo medo, e com um sorriso um pouco sem graça, onde notava a falta de dois dentinhos:
- Mamãe, sonhei com monstros, posso dormir com a senhora?
Ela era tão inocente, tão meiga, tão frágil, que até doía a ideia de perde-la pros monstros de seus pesadelos, por mais que eu soubesse que eles não existiam. Saí debaixo das cobertas, peguei ela no colo, aconcheguei-a na cama ao meu lado, e comecei a acariciar os seus cabelos, dizendo que ela não precisava ter medo. Passados alguns minutos ela já havia dormido e respirava tranquilamente, protegida de seus monstros imaginários.
Já tinha 7 anos, anos esses que passaram tão rápidos. Tinha a impressão de que ontem eu a carreguei em meus braços pela primeira vez. E agora ela já andava, falava, estudava, tinha seus amigos, e toda uma vida. Como 7 anos mudam as coisas! E como seria dali mais 7? Ela teria 14 anos, provavelmente teria alguns paqueras, estaria se formando no ensino fundamental, não teria mais medo dos monstros dos sonhos e não viria à minha cama com olhos assustados pedindo para dormir comigo.
Senti um pouco de saudade dos anos anteriores, da minha menininha que não saia da barra da minha saia, que me pedia pra brincar de boneca com ela, que segurava a minha mão pra atravessar a rua, que pra tudo gritava "mamãe", e então senti medo pelo futuro. Sabia que não poderia ser eternamente assim, afinal, dizem que criamos os filhos pro mundo, e assim já estava sendo.
Ela criava asas, e um dia alçaria voo. E com 7, 14, 21 anos ou mais, eu nunca deixaria de ama-la!

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7 anos de saudade ♥ Suzana



sábado, 12 de novembro de 2011

Missão

Despertei sentindo as mãos e os pés adormecidos, a boca estava seca e pegajosa, tinha a impressão de que havia caído de boca aberta nas areias do deserto e ficado lá por horas. Falando em horas, não fazia ideia de quanto tempo estive adormecida, talvez foram só minutos, mas considerava a probabilidade de terem sido dias. Abri as pálpebras com muito esforço, estavam absurdamente pesadas.
Escuridão. Não enxergava nada, a não ser sombras negras por toda a parte, porém não era a falta de claridade que me assustava, e sim um par de olhos completamente brancos que se destacava no meio de todo aquele breu, e que cada vez se aproximava mais.
Era vã a tentativa de mover os braços, colocar as pernas para correr ou pronunciar alguma palavra. Os membros não me obedeciam. Pensei em respirar fundo para me acalmar, e então tive uma pequena percepção de que eu não estava respirando, de que as narinas não inalavam os cheiros a minha volta, oxigênio não entrava para o meu corpo. E como eu ainda estava processando todos aqueles pensamentos se não conseguia respirar? E o mais estranho, eu não sentia falta de ar, eu não sentia necessidade de respirar.
Em meio a todo turbilhão de pensamentos e percepções novas, aqueles olhos totalmente brancos já se encontravam frente ao meu. Dois passos, acho que só isso separavam meus olhos verdes daqueles olhos assustadores, sem cor, sem pupilas.
Uma voz fina invadiu o ar, e senti um hálito quente no meu rosto, mais quente do que quando eu abria o forno de casa para tirar um bolo:
- Tão nova, tão linda. Ah garota tola, porque fez isso?
Eu era a garota tola? Se era, o que eu tinha feito? Não sei como percebia isso, mas aqueles olhos me miravam com ar de desaprovação e ao mesmo tempo de dó. Eram brancos e ainda expressavam tudo isso. Assustador. Assustadoramente assustador.
- Eu imagino que você ainda não consiga falar, é tudo muito novo pra você. Vou te ajudar.
De repente o branco dos olhos invadiu toda a minha vista, agora tudo era claridade, não havia mais escuridão, e em um instante eu me vi deitada no asfalto quente, a roupa suja com uma bela quantidade de sangue, as pernas estavam torcidas e anormais para um ser humano. Porque eu estava lá deitada daquela maneira?
E então tirei o foco do meu corpo e observei toda a cena. A minha frente havia um carro prata, com a frente muito amassada e pontilhada de sangue. Do meu lado algumas pessoas levavam as mãos à cabeça, viravam o pescoço para os lados, reprimiam um choro.
Toda aquela comoção começou a me tomar e eu esqueci de tentar entender o que acontecia, quando fui sugada para a escuridão.
Agora era possível ver o dono dos olhos brancos. Um homem alto e careca, que usava uma túnica negra e aparentemente não tinha os membros inferiores. Acho que era preferível ter a visão somente dos olhos.
- Você ainda não entendeu doce criança?
Já era possível me mover, e então apoiei as mãos lentamente ao lado do corpo, impulsionando o tórax para frente, a fim de sentar-me. Depois de um tempo sentada e pensando na cena, não era capaz de compreender aquilo, e olhei novamente para aquela criatura assustadora.
Ele sorriu, um sorriso que não mostrava dentes, apenas uma gengiva muito saliente e vermelha.
- Uma linda e doce adolescente, muito apaixonada, não aguentou ser desprezada pelo amor de sua vida, e então jogou-se na frente de um carro em uma linda manhã de segunda-feira. Plaf, o carro arremessou-a e ainda esmagou suas perninhas.
Eu lembrei, e a dor tomou conta de cada osso, musculo e nervo do meu corpo. Eu tinha me suicidado!
- Aqui é o inferno não é? Afinal, os suicidas vão para o inferno.
- Não - gritou a criatura, com um tom raivoso - Você não morreu ainda, embora eu quisesse já tê-la matado!
- Não entendo - e realmente não entendia, onde estava se não estava morta?
- Você está em coma há alguns dias, os médicos dizem que a chance de você sobreviver é nula. E assim eu espero que seja - deu uma pausa longa, pigarreou, olhou os meus olhos e continuou - A sua missão na Terra era simples minha doçura, e de toda forma a sua vida teria um fim dentro de alguns meses, só que você, muito burra, decidiu dar fim ao seu destino antecipadamente.
- Missão? Fim dentro de meses? - um pesadelo insano, era isso. Eu iria acordar!
- A sua missão, minha jovem, era ensinar aquele rapaz, que você amava, a andar com as próprias pernas. Era mostrar a ele que ele tinha capacidade para tudo, era tirar ele daquela comodidade e mostra-lo a vida. E você cumpriu com a sua missão, então...
Não deixei que ele terminasse de explicar mais nada, a raiva explodia no peito:
- Ensinei tão bem a usar as pernas, que usou uma delas para meter na minha bunda e mandar-me pra longe da vida dele.
- Sim - e um riso irônico tomou conta do ambiente - confesso que você realizou sua missão melhor que o esperado. E, como a sua missão era essa, você não tinha mais utilidade na Terra, e morreria dentro de cinco dias, de causas naturais, sem sofrimento.
- Sem sofrimento? Acha mesmo que não sofri quando ele pegou as pernas que eu ensinei-o a usar e meteu-as na minha bunda? Acha que não sofri vendo ele ser feliz com outra e realizando os nossos planos, meus e dele, com outra? Você não tem coração e não ama, por isso você diz sem sofrimento.
Percebi que estava em pé, sem qualquer tipo de dor pelo corpo, somente raiva. Raiva de mim, raiva daquela criatura na minha frente, raiva daquele moleque idiota que apareceu na minha vida, raiva dessa missão ridícula.
- E então, se eu iria morrer daqui cinco dias, e eu adiantei as coisas, porque o coma? Porque já não me levam pro inferno?
Os olhos brancos me fitaram com ironia e desdém. As gengivas salientes e vermelhas apareceram novamente naquele rosto assombroso:
- Você não vai morrer agora porque ele vai se sentir culpado, e isso não estava previsto no destino e na missão dele, sentir culpa pela morte da tolinha ex-namorada. Esse é o único motivo de estarmos conversando, para deixar bem avisado que você está proibida de tentar se matar novamente. Pare de interromper o ciclo natural.
Ridículo, tudo aquilo era ridículo. O cenário, o cara, a história, a missão. Ridículo.
- Fique calma, você não vai se lembrar disso quando despertar do coma, não vai lembrar de nada dessas coisas que está achando ridícula. Só vai se lembrar de que está proibida de tentar o suicídio!
A voz dele foi ficando fraca, os olhos foram se distanciando e sua forma se desfazendo na escuridão. Que vida desgraçada a minha, ter nascido só para ser útil a alguém e não ganhar nada com isso, eu ia me lembrar de tudo quando despertasse do coma e tentaria me matar de novo, e de novo, e de nov...

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Rosas murchas

Olho para as rosas no chão, estão murchas e cinzas, assim como ficou o meu coração. Talvez dentro do buquê ainda tenha espaço para alguma cor, para alguma vida renascer, mas dentro do meu coração só espaço para o escuro e para a dor.
E eu, que sempre acreditei que sentimentos eram fáceis de controlar, que sempre acreditei que ao estalar os dedos amaria ou desamaria uma pessoa, que sempre acreditei que não haveria amor maior que aquele que meu deu as rosas.
Ilusão! Me iludi com rosas, com amor. Iludi a alma e o coração.
Acreditei em sorrisos, em palavras, em passeios de mãos dadas e em promessas.
Fui julgada e acusada. Arremessaram palavras ásperas na minha face, como se o meu coração não fosse vivo, fosse uma rocha, sólida e cinza, contudo ele ainda era vermelho-sangue.
Usaram a palavra NUNCA para meus atos que eram tão constantes. Sim, eu acreditei no amor, eu acreditei em tudo o que eu vivia, se eu não acreditasse, não teria lutado.
E hoje, hoje acredito que o NUNCA não era para mim, o nunca era para ele mesmo.
Por algum tempo ainda admirarei as rosas murchas, que ficarão marrons, que secarão, que virarão pó; e pó também virará o meu amor, que foi trocado por tristeza, por desprezo, por um principio de raiva, ódio, incompreensão.
Só as lembranças não virarão pó, entretanto se tornarão cinza, e uma hora eu NUNCA relembrarei a cor que aqueles meses tiveram em minha vida, assim como não hei de lembrar a cor das rosas murchas.


sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Sob o véu da manga

A manga da camiseta escondia o desenho estampado nos músculos definidos, e isso causava um frisson na população feminina da sala. Conforme os braços se movimentavam para escrever no quadro negro, a camiseta mostrava mais, ou as vezes menos, o desenho, porém nunca mostrava tudo.
Era o mistério que deixava ele mais sexy, que guiavam os olhos das garotas para aqueles braços, que faziam as mentes trabalharem para adivinharem qual seria o desenho. Algo sexy? Algo másculo? Algo romântico?
As mentes maquinavam, os olhos vidrados admiravam, as bocas curiosas falavam das hipóteses.
Dia após dia, aula após aula, semana após semana. Lá estavam as camisetas sem graças, que escondiam o que poderia aumentar o delírio das meninas.
E então um dia o calor foi amigo do público feminino, e as camisetas não apresentavam mangas. Frisson, frisson, frisson. Garotas alvoroçadas, olhos, mentes, bocas, o corpo todo atento, esperando o momento de, enfim, acabar com o mistério. E lá, nos lindos músculos definidos que pela primeira vez se apresentavam nus ao mundo, estava o desenho, estava a estampa de um palhaço dançando.
As mentes agora só trabalhavam para fazer as bocas rirem. Um palhaço. Tanto mistério, tanta excitação, por um simples e ridículo palhaço!
Agora nem os músculos mais pareciam ser tão sexy, nem o conjunto todo da obra parecia ser sexy. Talvez a única coisa sexy era a manga da camiseta.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Escada

As crianças corriam alegremente pelo pátio da escola, era hora do intervalo, e todos os intervalos eram iguais. Da cozinha vinha o cheiro do leite quente, do pão com manteiga. Do banheiro, o cheiro fétido de urina. Das bocas das crianças vinham os gritos, os risos, as fofocas, os segredos, os beijos escondidos atrás do muro. Do inspetor vinha a calma, a observação, a capacidade de fingir que nada de errado havia, ou a real capacidade de não deixar nada de errado acontecer. Do canto, mais frio e mais distante de todos os cheiros, de todos os barulhos, de todas as bocas e olhos, estava ela.
Antes nunca tinha notado aquele canto da escola, porque estava no meio de toda aquela festa que era o intervalo. Nunca tinha notado como era gostoso sentir o sol da manhã na sua pele, como era algo mecânico e fascinante subir uma escada. Escada. Era lá, na frente da escada que ela estava sentada, e admirando os degraus acima.
Um homem se aproximou:
- Porque está admirando tanto a escada? - indagou
Ela tinha vergonha de responder, só tinha os olhos marejados. Há alguns meses ela reclamava de ter que subir e descer as escadas para trocar de salas ou para o intervalo. Hoje, sentia de não poder subir as escadas. E como explicaria isso para ele? Não, os pés dele se movimentavam, ele nunca tinha percebido como era gostoso subir uma escada, a sensação de ir cada vez mais alto, de subir, de atingir o céu. Ele nunca olhou as escadas com outros olhos, como ela olhava agora.
- Tem alguma coisa aí que eu não estou vendo? - insistiu ele.
Sim, claro que tinha. Tinha o sonho dela de voltar a andar, de levantar daquela cadeira de rodas e poder colocar os pés no chão, de sentir as articulações do seu corpo se movendo naturalmente, pé ante pé subindo os degraus. Subindo. Indo mais alto, indo ao topo, indo ao céu. Havia muito mais em uma escada do que simples degraus. E como antes, achando todos seus pensamentos e sonhos ridículos, não respondeu isso a ele, apenas balançou a cabeça negativamente.
O sinal anunciou o fim do intervalo, o fim dos cheiros diversos, das vozes variadas, o fim da festa.
Braços vieram na direção dela, carregaram seu pequeno corpo em cima daquela cadeira até o topo da escada para que pudesse assistir a aula. Por mais que fosse magra, sabia que com a cadeira se tornava pesada, e não era simples para aqueles braços, por mais másculos e fortes que fossem, carrega-la até o ultimo degrau.
Deu um leve sorriso quando chegou no topo e um dos braços másculos que carregou a cadeira se massageou, se agitou freneticamente tentando escapar da dor. Porque ela sabia que o dono daqueles braços entendia o sonho dela, ele com certeza não via mais uma escada como um simples conjunto de degraus, ele sentia os obstáculos e as dificuldades de cada movimento, ele sentia como era difícil chegar ao fim, talvez ele sonhasse em, de uma forma mais fácil, subir aquelas escadas.
Percebeu que seus sonhos não eram ridículos. Que sonhos nunca são ridículos, por mais que envolvam subir uma escada.
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domingo, 28 de agosto de 2011

...

Chegou exausta e colocou os dedos no interruptor para acender a luz, que não acendeu, afinal, há dois meses não pagava a conta. Decidiu tomar um banho, mesmo que frio, para tentar relaxar, e não se espantou quando o chuveiro não lhe despejou nenhuma gota d'água. O estômago anunciou que estava faminto, não comia há quase 24 horas. Abriu a geladeira, praticamente vazia, uma garrafa d'água, uma panela com arroz velho e um resto de leite, era apenas isso. Pegou a panela, abriu-a, e o cheiro azedo invadiu o ambiente, a mesma coisa ocorreu com o leite; o pouco que tinha de alimento estragou com a falta de energia. Quis chorar, mas parecia que seu corpo estava em harmonia com a casa e não tinha força nem água para fazer as lágrimas despencarem. Pensou em morrer e deu uma risada, notou a barbaridade do pensamento. Morrer? Mas aquilo que ela tinha podia ser chamado de vida?

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Conquistando tesouros

Você já lutou com todas as suas forças por alguma coisa? Já desejou algo intensamente que não media esforços para conquistar? Alguma vez, mesmo sofrendo, persistiu naquilo que todo mundo dizia ser um erro?
Talvez você nunca tenha encontrado algo de tão grande valor na vida a ponto de se entregar de corpo, alma e coração e, se ainda não encontrou, espero que encontre, porque mesmo que seja sofrido, é magnífico!
Estava relendo os meus primeiros textos desse blog, que foi criado justamente na semana que eu encontrei o ''maior tesouro'' da minha vida. Todos os textos se referiam a tal tesouro, no começo palavras apaixonadas e esperançosas, e com o tempo, palavras apaixonadas, tristes e sem esperança.
Muitas pessoas me chamavam de idiota pelo sentimento que eu nutria, me ofendiam, riam de mim, e queriam até me ver sofrer mais, para ''aprender'' (como diziam). E eu nunca ouvi essas pessoas, porque era o tesouro da MINHA vida e não da delas, eu precisava daquilo pra mim, do meu lado, era quase uma questão de sobrevivência.
Não foi fácil, porque se tem uma coisa que machuca é a rejeição, é você fazer de tudo pra conquistar algo, e ver que a conquista está longe ou que é quase impossível. Porém, coisas fáceis não geram tanta emoção quando são conquistadas.
Várias noites encharquei o travesseiro de lágrimas, desligava o computador revoltada e me odiando por insistir nesse sentimento. Muitas vezes acordei decidida a esquecer tudo e caçar outro tesouro por aí, só que uma palavra ou um sorriso me faziam continuar persistindo nessa ''insensatez''. Em alguns momentos eu questionava se tudo isso era realmente amor ou se era orgulho, mas sempre chegava a conclusão que era, e é, amor.
Em uma época que o "eu te amo" é tão banalizado pelos meios de comunicação (principalmente a internet), eu esperava ansiosamente pelo momento que conseguiria ouvir isso. Esperei ansiosamente 1 ano, mas eu ouvi, eu ouvi um "eu te amo" com sentimentos verdadeiros. Aí eu vi que tudo valeu a pena, todas as lágrimas, todas as críticas alheias, as noites em claro, a insistência.
Hoje faz 1 ano que eu consegui "conquistar o meu tesouro", não me arrependo de nada, e faria tudo novamente, do mesmo jeitinho, porque ele é o motivo dos meus sorriso diários!

domingo, 24 de abril de 2011

Sonho

Sonho. O que eu sonho? Será que eu sonhei essa vida pra mim ou sonharam ela e colocaram esse sonho em minhas costas? Ou eu fugi do caminho do meu sonho? Ou eu nada sonho, e pra não parecer inútil, vagabunda, ignorante e tudo o mais, perante a sociedade, eu invento que sonho?
Muitas vezes não queria sonhar, não queria planejar um futuro, queria viver o hoje, sem problemas pro amanhã, sem dúvidas, sem anseios.
Sonhei muitas coisas nos meus 19 anos. Ser professora, ser bióloga, ser jornalista. Ser famosa, ser rica, ganhar na mega sena. Ter carro importado, ter uma mansão, ser a menina mais linda do mundo. Ser mais magra, ter mais amigos, achar o príncipe encantado.
Muitas noites deitei a cabeça no travesseiro e demorei pra dormir pensando no futuro. Fiquei com medo de muitos encontros por causa de um futuro incerto. Adiei algo pro futuro, e nunca consegui realizar.
Maldito futuro. Inimigos de todo santo dia! Inimigo do presente, da boa noite de sono, da mente serena.

E então hoje eu sonhava em ser jornalista, pensei em muitos planos futuros, e de repente, não é mais obrigatório o diploma para exercer a profissão. Não sei como, do dia pra noite, eu decidi sonhar em ser professora de Português.
Hei, espere aí! Eu toda vida odiei português na escola, detesto as malditas regras gramaticais que também me impedem de viver o presente! Não consigo fazer corretamente uma análise sintática, e tempos verbais me arrepiam.

Sim, hoje eu sonho com regras gramaticais, hoje elas são o meu objeto de estudo e de trabalho, eu sonho linguística, literatura, didática, espanhol. Eu sonho tudo que um dia foi meu pesadelo.

E então, eu não sei se quero mais esse sonho inventado, criado, copiado, imposto, esse sonho doido e sem sentido, esse sonho que me tira o sono, que me tira lágrimas, que me afasta da família, que me fez perder amigos, que me faz sentir saudades do namorado, que me levou pra longe do aconchego da minha casa, que me força a amadurecer e ser independente de uma forma brusca e sofrida.

Sonho para ter um futuro. Afinal, trabalhar em uma lojinha, como balconista, ganhar um salário, chegar em casa e fazer comida para os filhos, assistir TV com a família, é coisa de quem pensa pequeno.
Talvez seja mesmo, pra essa sociedade que quer massacrar de todas as formas a pessoa, mas não é para aqueles que são capazes de aproveitar o seu futuro.

Sonho para uma coisa incerta, para uma coisa vaga, para o indefinido. Pode ser que sonho para nada!

sexta-feira, 18 de março de 2011

Monstro...

Milhares de vozes ecoam ao fundo, vozes conhecidas, alegres, alteradas, nervosas, altas, baixas, sussurros! Nenhuma voz chega perto de mim, elas rodeiam, e não param nunca, elas não se calam para me ouvir.
As mãos tremem, se agarram fortemente a superfície sólida da carteira para tentar evitar o tremor, em vão.
A visão embaçada percebe a chegada do monstro. Sua silhueta surgi na porta, e aos poucos as vozes se calam. Ele não é maior que um homem, tem duas pernas, dois braços, apenas uma cabeça, com dois olhos, um nariz e uma boca. Ele é um humano!
Falta o ar, o coração parece que está parando, os olhos só sabem chorar.
Não, a culpa não é do que acabou de chegar. Eu disse monstro? Era apenas o professor entrando na sala.
O monstro mora dentro de mim, ele não sai, ele não quer ir embora. Eu peço, eu imploro, eu choro o dia todo. Ele insiste.
Não sei como ele é, nem se tem corpo, nem se ele existe, ou eu criei. Não tomo alucinógenos, não preciso dele pra criar as ilusões das minhas dores e do meu desespero.
Choro, ouço as vozes longe, temo o monstro.
Quando ele vai me tomar por completa? Quando ele vai me enlouquecer de vez?
Já me vejo numa camisa de força, homens com braços fortes me agarrando, um prédio branco, enfermeiros, médicos, agulhas, remédios. Loucura total!
- Vai embora, por favor!
Imploro novamente, tento focar a atenção no homem que fala para sala, tento fazer as vozes se aproximarem, quero enxergar perfeitamente, quero respirar.
- Por favor, desamarre os meus pulmões!
Não, ele não desamarra, ele aperta mais. Ele faz a visão ficar pior, e aumenta o medo, a angustia, a vontade de chorar.
E eu sei que ele não morre, talvez eu possa fazê-lo dormir, eu já fiz isso uma vez, há dois anos, e ele dormiu até alguns meses atrás. Sim, se eu acreditar em mim eu posso fazer. Porém é difícil combater aquilo que você não vê. É difícil explicar pra todo mundo que a culpa é desse monstro. As pessoas não acreditam, acham que eu tenho frescura, que eu estou fazendo cena, que eu exagero. Mas elas são maldosas em pensar assim, elas não veem que eu quase enlouqueço com o monstro?
Você acha que é fácil pra uma garota de 19 anos assumir a sua loucura? Ouvir do médico que ela precisa ir ao hospital psiquiátrico?
Pra uma criança é legal ter um amigo invisivel, mas pra uma jovem é horrível ter um inimigo invisível.
Preciso da minha mãe, ela acredita em mim, ela conhece o monstro, e eu sei que ela me ajuda a fazer ele dormir, mas minha mãe está longe. Meu pai também, e meu irmão, meu namorado, minha família. Distantes!
Lembro da música de ninar: "Dorme neném que a cuca vem pegar, papai foi na roça, mamãe foi trabalhar"
Tenho a impressão de que fui um neném desobediente, eu não dormi então a cuca me pegou. Mas a cuca não parecia tão má assim no Sitio do Pica Pau Amarelo.
Depois o doutor me diz que não é a Cuca que me pegou, foi o Pânico, é assim que chama o monstro. Ele não veste uma capa preta e uma mascara branca com uma boca ''aberta'' enorme. Ele domina a minha mente, traz reações ao me corpo, tira a minha vontade de comer, de sair, de estudar, de levantar da cama.
Grito. Choro. Peço ajuda.
EU QUERO VIVER!
Algumas pessoas me ouvem, se aproximam, percebem o meu estado e acreditam em mim. Elas não veem o monstro, mas são meus amigos, e tentam me ajudar. Eles fazem o monstro dormir. Ufa, eu posso respirar, comer e rir.
Pode ser que daqui algumas horas o monstro acorde, ou daqui semanas, meses, anos. Espero que nunca mais. Eu só quero PAZ!

sábado, 29 de janeiro de 2011

Os opostos se repelem!

Durante um show de rock eu comecei a minha filosofia sobre essa história de opostos se atraírem.
Eu curtia rock. Pelo menos, eu fingia curtir, enquanto eu ainda seguia os gostos do meu irmão. Depois as coisas mudaram, eu criei autonomia, e comecei a gostar das coisas por mim e não por ele. Rock ficou pra trás. Nada mais de bandas berrantes, sons de guitarras elétricas e tudo o mais.
Não que eu odeie esse estilo de música, nada contra! E até aprecio algumas músicas assim. Porém, dou preferência pra outras coisas, como por exemplo, um samba ou pagode.
O que eu fazia em um show de rock? Fazia companhia a uma pessoa. Eu não fui pelo som, pelo estilo, pela banda. Fui por amor a quem estava comigo.
Mas quantas pessoas fazem o que não gostam por amor ao outro? Acredito que não são muitas, eu, pelo menos, vejo que não dei essa sorte.
Todos os shows da banda que eu gosto, eu vou desacompanhada, eu nunca vou dançar com aquela pessoa com quem eu deveria estar dançando, eu nunca vou poder cantar no ouvido daquela pessoa trechos de músicas que eu gosto e que eu acho que se encaixa na nossa história. Eu nunca vou poder fazer isso porque temos gostos opostos!
Imagina você, compra um ingresso pra assistir a um espetáculo de balé, porém vai sozinha, seu namorado prefere street dance e não cogita a ideia de te acompanhar. Você senta cercada por casais, a música romântica te contagia, você se emociona com os passos, os voos, a leveza, e todo o envolvimento da dança. Você não tem ninguém ao seu lado com quem dividir isso!
Planeja uma viagem dos seus sonhos, uma praia, muita areia, sol, água salgada. Mas quem está com você prefere a neve, e não arreda o pé! Você viaja sozinha, aproveita tudo sozinha. Ou, fica na sua casa sonhando com a viagem.
No domingo, calor, você quer ir tomar um sorvete, dar uma volta, já que não suporta futebol. Porém, ele fica jogado no sofá, gritando horrores, suando, e você aguentando tudo!
Eu me pergunto, como sobrevive um relacionamento onde as pessoas não tem nada em comum? Se ambas abrirem mão as vezes, pode até funcionar. Mas e quando só um lado abre mão? Ou quando nenhum dos dois arreda o pé?
E então, cada um vai pro seu canto, com a sua tribo, faz o que curte, e depois, se vê, da alguns beijinhos, trocam umas palavras. Não dividem uma vida, não fazem parte da vida um do outro.
Como pode falar que opostos se atraem? Qual a graça de ouvir um NÃO pra tudo que você diz SIM ou vice e versa?
Por isso, no meio de sons e berros estridentes, eu tive a total certeza que os opostos só se atraem em química e física. No amor, os opostos se repelem!

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Correria

Os pés se movimentavam rapidamente, as pernas esforçavam-se. Ela corria na mais alta velocidade que conseguia.
Enquanto corria pelas ruas, os pés pisavam em poças d'água que a chuva da tarde formara, e molhava seus sapatos e suas meias, porém, correr era mais importante que tudo.
No ritmo dos pés ia também o coração, cada vez mais acelerado. Parecia que ele queria saltar do peito, que dava murros pelo lado de dentro. Os pulmões também sentiam a velocidade, sentiam a falta do ar, que entrava com dificuldade pela boca aberta, que puxava todo ar que podia, já que o nariz não dava mais conta dessa tarefa.
A cada minuto de corrida olhava pra trás, precisava garantir que daria certo. E fazia a coordenação de movimentar rapidamente as pernas e mover a cabeça.
Chegou em um ponto de ônibus, para sua alegria tinha uma pessoa lá, uma velhinha que fazia um bordado. As pernas se acalmaram, e começaram a andar calmamente, o coração foi voltando ao ritmo normal e os pulmões agradeceram pelo ar que entrou fartamente pelas narinas. Ela se aproximou mais da senhora, e disse:
- O ônibus pra São Paulo já passou?
A velhinha sorriu, e disse que não.
Ufa, pensou ela, a correria não tinha sido em vão, ela conseguiria ver os pais naquele natal.