domingo, 5 de agosto de 2012

Estranhos sorrisos.

Pessoas estranhas sorriam para mim. Eu não me lembrava de nenhuma delas, daqueles braços, olhos, narizes, ou dos próprios sorrisos. Não sabia como eram as vozes, os cheiros, os nomes. Eram pessoas estranhas. Porém, se eram estranhas, porque sorriam para mim? Porque estavam lá, em porta-retratos, guardados no fundo de um baú com outras quinquilharias minhas, que não me eram estranhas?
Alguma coisa estava escrita em um dos porta-retratos, estava um pouco apagado mas dava para ler, e então enxerguei as palavras "Verão de 2009". E naquela foto muitas moças de biquini continuavam a sorrir, debaixo daquele sol escaldante, com os pés descalços na areia quente, e então senti os meus pés queimarem, porque um par de pernas lá era meu, meus pés também estavam na areia quente, meu sorriso estava congelado sorrindo para mim mesma agora, dez anos depois. Eu também era uma pessoa estranha naquela foto, quase irreconhecível.
Mais para baixo do baú havia outro porta-retratos, neste havia um esparadrapo escrito "Apresentação de 2008", e vários rostos brancos de bocas pretas me sorriam. Se já eram estranhos sem as máscaras, agora então, eram completos desconhecidos. Lembrei-me vagamente de que na época eu ia a um grupo de teatro, e me caracterizei quase daquele jeito. Devia ser isso, com certeza era isso. Mas ainda assim, eram estranhos.
Passaram-se mais de dez anos e eu não havia mais visto aqueles rostos, aqueles sorrisos. Talvez, alguma vez tenha sonhado com eles, lembrado bem vagamente, mas uma lembrança tão vaga que não acreditei que era de algo real do meu passado. 
Pelos sorrisos, deveriam ser estranhos agradáveis, estranhos que me fizeram feliz, que tinham boa relação comigo, mas que hoje, eram somente estranhos sorrindo.
Cogitei de jogar os retratos fora, mas não consegui, aqueles sorrisos estranhos e aqueles estranhos sorrindo tinham despertado alguma coisa em mim. Saudade? Talvez. Curiosidade? Mais provável. Afinal, quem eram? Como estavam hoje? O que faziam?  Era interessante olhar pra cada rosto e imaginar a vida que levavam, o emprego que tinham (ou não), os relacionamentos, os filhos. 
Acima de tudo, as fotos despertaram a imaginação. Rostos borrados, de lembranças apagadas, que eu podia fazer deles o que bem entendesse, podia criar neles amigos perfeitos, momentos perfeitos, que combinassem com o sorriso que me davam. 
Não lembrava mais deles, mas o importante é que eles ainda me faziam sorrir.

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