quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Voar e ser luz...

- Ah Bianca vem pra cá. Sente esse vento, veja essa avenida iluminada!
Luiza estava sentada na janela do seu quarto, morava no quarto andar de um prédio da Av. Paulista, e se maravilhava ao ver as luzes daquela altura, ainda mais a noite, um brilho magnifico. Bianca era sua melhor amiga, estava sentada na poltrona de Luiza, tinha uma revista na mão mas não se importava com o que estava escrito, prestava atenção apenas na amiga.
- Você é louca, sabe que é perigoso. E se você se desequilibrar?
- É mesmo Bia, e se eu cair?
- Cala a boca Luiza, você não vai cair, entendeu? Não vai?
- Nossa Bia, mas agora mesmo era você que estava falando que eu podia me desequilibrar.
- Ah Luiza, você me tira do sério.
- Bia, imagina como deve ser? Você sentir o vento tocando todas as partes do seu corpo, toda a musculatura se relaxando, os passaros voando ao seu lado. A sensação de liberdade deve ser imensa. Voar do quarto andar!
- Acordaaaa! Não temos asas.
- Quem disse que preciso delas?
Luiza fez um movimento rápido, e colocou os pés na janela. Agora não estava mais sentada balançando as pernas do lado de fora. Ela apoiava com uma mão no trilho da cortina que estava do lado de dentro e outra em um ganho ao lado de fora, onde deveria estar pendurada a rede de segurança, que ela havia removido há alguns instantes, para tomar um vento e ver melhor as luzes.
Bianca começou a ficar nervosa, não queria ver a amiga desequilibrando e caindo do quarto andar. Não queria perder a melhor amiga, e sabia que uma queda do quarto andar era morte.
- Bia, as luzes são lindas, venha ver, para de ser boba. Azul, verde, amarelo, vermelho. Vermelho como sangue.
Essa ultima observação não foi muito bem aceita por Bianca, que fez cara de nojo e revirou os olhos.
- Eu já vi essas luzes Luiza, se você não se lembra eu moro no prédio da frente. Agora desce daí e vamos as compras.
- Compras? Vou comprar o que? Meus pais não vão passar o natal comigo Bia, lembra que eles sofreram um acidente de carro e morreram mês passado?
- Eu lembro - respondeu a outra, com uma voz baixa, e como se pedisse desculpas. - Mas faça compras pra você.
- Bia, eu queria comprar a paz, a liberdade, queria comprar algo que preenchesse esse vazio do meu peito. Quem sabe comprar a vida dos meus pais de volta? Ou se não comprar um caminho para me juntar a eles.
- Cala a boca Luiza! Você sabe que só tem um caminho, e é mor... - Bia não conseguiu terminar a palavra, mas a amiga se adiantou.
- Morrendo! Sim Bia, morrendo! Mas que besteira a minha, não preciso comprar a morte, é só eu soltar as mãos aqui e pronto, morri! - Quando terminou a frase, ela soltou a mão do gancho ao lado de fora, e começou a tremer as pernas, como se perdesse o equilibrio. Bia ficou apavorada e começou a gritar.
- Calma sua escandalosa, eu só estava brincando, estou aqui, inteira e viva. Mas seria maginfico me juntar a essas luzes, a esse vento.
- Vou embora Luiza, você está me assustando.
Luiza abriu um pequeno sorriso, desceu da janela e deu um forte abraço na amiga, pedindo desculpas por assusta-la. Depois levou-a até a porta do apartamento, se despediu calorosamente, dizendo o quanto Bia era importante na vida dela, e deu um embrulho dourado com um cartão como presente de natal para ela.
Bia desceu o elevador rindo. Ria da amiga louca que tinha, ria do susto que levou achando que ela ia mesmo se jogar da janela, ria de tudo. Saiu do prédio e atravessou a rua, ia feliz pra sua casa, até ouvir a voz de Luiza.
- Hei Bia! Aqui em cima.
Maluca. Pensou Bia, aquela maluca estava de novo em pé na janela. Bia pulou, acenou, gritou para ela sair de lá. Mas o barulho da avenida era maior que o de sua voz, e então ela ouviu.
- Bia, voar como os passáros, ser luz!
E então, em segundos o corpo de Luiza estava voando ao chão, os ossos quebrados, o sangue vermelho, vermelho como as luzes de natal da Paulista!

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Em casa...

Faz muito tempo que não uso meu blog como um diário, para desabafos, para homenagens às pessoas. Mas hoje é um dia diferente. Essa terça-feira 21 foi praticamente uma sexta-feira 13 na minha vida! Não, eu não vi um lobisomem, ou fui atacada por vampiros, ou coisas maléficas assim.
Primeiro, a madrugada foi muito quente, os pernilongos me devoravam, e eu sonhei que tinha brigado com o meu "affair" (se você quiser, pode chamar de namorado, todo mundo denomina nosso relacionamento como namoro, mas ele não o faz, então, é melhor eu também não denominar assim).
Depois, acordei tarde, e tinha um bilhete da minha mãe descrevendo as tarefas domésticas do dia. Um calor insuportável e eu limpando a casa, lavando quintal, lavando as louças. E o panetone que comi no café da manhã não foi muito bem aceito pelo estômago.
Enfim, meio do dia, o meu "affair" entra no MSN, e o sonho torna-se realidade, a gente briga! Isso é constante, as vezes até demais. Sei que não sou uma pessoa muito fácil de lhe dar, sou exigente, talvez complexa. O problema pode ser que eu realmente sei o que eu quero, e nem sempre vou encontrar pessoas dispostas a isso.
Detesto brigas assim, porque eu fico irritadamente irritada pelo resto do dia, fico seca e fria, não quero mais saber de conversas, e tudo me estressa.
Pra melhorar quebrei um copo, fui ler um livro que me indicaram e odiei ele, o filme da sessão da tarde me deu tédio! E depois de tudo isso, briguei outra vez com a mesma pessoa.
Sim, eu tenho uma facilidade incrivel pra iniciar discussões, mas não para termina-las.
E eu não sei o que vem acontecendo comigo, mas desde que eu voltei pra Americana, a minha paciência tem diminuido.
Com isso, eu percebi que talvez as pessoas tenham razão, que quando você sai de casa, mora sem os pais em outra cidade, aquela nova casa poderá ser chamada de LAR. Porque é pra lá que eu tenho vontade de correr, de se trancar no meu quarto e chorar, e depois ir pedir um ombro das minhas irmãs de república. A minha mãe não entenderia a minha briga, os meus sentimentos, e sei que elas entenderiam.
E tudo isso me deixou com saudades DE CASA, fez um buraco no peito e ficou vazio. Por um momento foi quase possível sentir o cheiro de lá, o ar puro da cidade não desenvolvida, as gargalhadas da Lah, a serenidade da Dri, as loucuras da Débora, o companheirismo do Guto.
Só que depois de todas essas lembranças e saudades de Assis, eu me surpreendi com amigos americanenses. Nessa terça com aspecto de sexta-feira 13, eu praticamente ganhei o perdão de um amigo, eu ganhei um abraço que me reconfortou de tudo, que me refez. Eu gargalhei como uma criança, eu brinquei como tal. Eu me senti em casa.
Por fim, percebi que não são as paredes e o telhado que fazem o meu LAR, e sim as pessoas que estão a minha volta. E onde eu tiver pessoas que me façam sorrir e que me dê um abraço amigo, que enxugue as minhas lágrimas e me perdoe, eu vou me sentir em casa.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Melhores amigas

Meu nariz não estava mais acostumado ao ar poluído de Americana e queimava, minhas pernas chacoalhavam freneticamente com a impaciência em esperar um ônibus, e o frio arrepiava os pelos do meu braço. Fazia tempo que eu não visitava Americana e mais tempo ainda que eu não pegava um circular naquela cidade.
Já era noite, a rua estava totalmente vazia e, para ajudar, o poste que era responsável por iluminar o ponto de ônibus estava apagado.
Meus olhos percorriam toda a extensão da rua, meu pescoço virava-se rapidamente de um lado ao outro, minhas mãos percorriam meus braços afim de esquenta-los, e as pernas continuavam a chacoalhar no seu ritmo frenético. Então, eu avistei um vulto que virava a esquina e vinha em direção ao ponto do ônibus. Isso me trouxe paz, que até as pernas se aquietaram. Eu detestava ficar sozinha.
O vulto foi se aproximando e trazendo mais paz, porque era alguém conhecido, ou pelo menos eu achava que conhecia. A luz do poste foi acendendo, e fracamente iluminou o vulto, os cabelos longos e escuros eram bagunçados pelo vento, e aqueles olhos castanhos por debaixo do óculos eram familiares.
O vulto transformou-se em pessoa, chegou finalmente ao ponto do ônibus e sentou-se ao meu lado. Por um momento pensei que eu estava confundindo a pessoa com alguém, porque ela mal olhou para mim, não deu um sorriso e nem acenou. Então comecei a olhar atentamente, a estatura era a mesma, o jeito de sentar, as roupas com o mesmo estilo de antes, ela não havia mudado em nada, e eu também não, pelo menos acreditava que não, por isso era difícil acreditar que não havia me reconhecido.
Neste momento olhei para o poste, e pensei que o motivo poderia ser a pouca luz, e veio a ideia de conversar com ela, assim ela reconheceria. Limpei a garganta, passei a língua pelos lábios, e disse:
- Olá!
Demorou para perceber que eu estava falando com ela, olhou para os lados, admirou a fraca luz do poste, e então respondeu.
- Ah, olá. Me desculpe, não notei que falava comigo.
Eu abri um sorriso, era muito bom ouvir aquela voz amiga, que tantas vezes tinha me consolado, me feito rir, me dito palavras de carinho e de amor.
- Como você está? - tentei prosseguir a conversa
- Estou bem, obrigada.
A conversa foi interrompida por ela, não quis prosseguir, não perguntou como eu estava. Talvez ela não estivesse muito bem, não quisesse conversar. Virei meu rosto para o outro lado da rua, vendo se meu ônibus não vinha, e decidi esquecer a presença dela, que se antes me trouxe paz, agora aumentava o frio.
Mas, ela pareceu notar a tristeza fixando-se em minha face, e continuou a conversa:
- E você, como está?
- Bem. - Se ela sabia ser fria, eu também sabia, e parei nisso.
Minhas pernas voltaram a se mexer num ritmo descompassado e rápido, minhas mãos estavam inquietas procurando aquecer meus braços, e minha cabeça percorria toda a extensão da rua, com a esperança de que meus olhos vissem o ônibus.
Ficamos em silêncio, cada uma com sua reação corporal, com sua respiração calma, sem olhar diretamente uma para a outra. E passado alguns minutos, meus olhos avistaram o ônibus que eu precisava pegar.
Levantei-me, e dei sinal para o ônibus. Olhei pela ultima vez para ela e disse:
- Passar bem!
Ela levantou os olhos e me encarou:
- Me desculpe, mas quem é você?
A sensação era como se alguém tivesse socado meu estômago, um calor tomou conta do meu rosto e lágrimas escorreram da minha face. Ela realmente não se lembrava de mim. Antes que eu pudesse refrescar-lhe a memória o ônibus estava parado, esperando o meu embarque, e antes que eu entrasse respondi:
- Você costumava me chamar de melhor amiga.